sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Angústia moderna

Não deve ser só a minha, mas é algo que, muitas vezes, confesso, não me deixa dormir. Ao assistir e ouvir as novas ondas de músicas, principalmente, de funk, não sei, sinceramente, onde começa o meu preconceito e onde termina minha capitulação. 
Abomino o comportamento preconceituoso diante de quem não entende a manifestação da cultura popular, de quem enquadra o conceito de "bom" em fôrmas pré-fabricadas de uma elite tão ignorante quanto os próprios padrões que impõe. 
Abomino a onda pseudo-intelectual, pintada de che-guevarismo, que só é boa a música alternativa -- a new wave é a argentina --, a MPB feita na ditadura, os aros grossos dos indies, aquela chatice de olhares blasé, frases soltas e efeitos instagram. Inclusive essa turma se acha o contraponto à primeira, o que não o é definitivamente -- só é outra fôrma, mas com poá vermelho e filtro laranja. 
Feminista que sou, também procuro entender que tipo de discurso as mulheres recorrem para denunciar um mundo de opressão, principalmente, aquelas que sofrem a dupla, incluindo a de classe. E torna-se óbvio que aprofundar as contradições do machismo -- reforçando "ao revés" o preconceito -- pode causar um efeito de choque contraditório. 
Porém não posso negar que há um limite. Não sei qual é. Mas algo que diz, que sim, o há. Eis aí a minha (ou a nossa, acredito que mais pessoas devem sentir isso) angústia. Assistir mulheres fazendo o "quadradinho de 8", letras feitas a partir de criado-mudo, repetições sem sentido e a sensação de que "qualquer coisa" vira sucesso é angustiante. Tão angustiante quanto ver que qualquer coisa melódica com um fundo de violão, um triângulo, uma rima pobre (ou sem rima mesmo, mas pobre) e uma cara blasé explode no meio que se auto-denomina intelectual. Tão angustiante quanto ver que qualquer patricinha do cabelo colorido cantando coisas em inglês, tomando porre e dando pt com a imprensa de plateia explode no meio pré-adolescente e por aí vai. A tragédia fica mais evidente no funk por várias questões -- pessoais, sociais, morais, políticas, econômicas --, mas o quadro geral é decadente. Desesperador. 
Uma análise séria partiria do princípio que o sistema capitalista é maquiavélico, portanto se aproveita do que é "essencialmente" popular, digere e devolve como lixo cultural. Mas, sabemos, as coisas não são lineares. Elas são cíclicas e contraditórias. E é onde eu me pergunto: É possível avaliar o funk sem ser preconceituosa? Ou melhor, é possível ter um olhar crítico sobre esse fenômeno sem carregar o vício acadêmico, o preconceito social, os vezos morais? Como analisar a qualidade de um fenômeno musical, ainda em seu tempo, se afastando "conceitualmente" dos valores dele?

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